sexta-feira, 31 de maio de 2013

CASOS   Quase piadas

Na areia da praia, Arraial do Cabo,  lua bonita no céu, um pescador iniciava namoro com uma turista.  Ao tentar  desabotoar  o seu  sutiã,  encontrava   dificuldade para abrir o fecho...      
Nisso a moça falou:
- Você não vai conseguir, não...
- É ruim de não, hein... Acostumado a tirar coió de rede...

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CASOS    Quase piadas

No bar do  Cabral,  muito bem frequentado – democraticamente-  por várias  tribos, acontece de quase tudo,  até o que vai a seguir:
No balcão,  dois fregueses   gabam-se  das conquistas amorosas do fim de semana,  quando  um deles indaga:
- E aí, pegou aquela  lourinha...?
Ao que o outro humildemente responde:
- S S...
- Como assim?
- Sem “shance”...

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CASOS   quase piadas

Everardo Mureb bebia uma cerveja com Beca no antigo bar de Noé, na rua Rui Barbosa, como sempre, zoando com  quem desse chance.   Em certo momento Noé entra no banheiro (Como não havia outros fregueses, adivinhem, sobrou pra quem...?)   e os dois o prendem lá dentro e  ficam aguardando a bronca.
Minutos depois o Noé  começa a bater na porta, pedindo  que a abrissem... Nada.  Noé perdendo a paciência, que não lhe era grande,  inicia o xingamento... Seu isso, seu aquilo, abre esta  m... E por fim,  aporrinhado, ameaça:
- Ô Beca, não te vendo mais fiado... !
Só assim conseguiu ser solto.
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Contado por Éve.


DO MORRO DA GUIA...
09 – PARAGUAI

Ainda bem que estávamos saudáveis, pois ao chegar de madrugada na capital paraguaia, o motorista nos pediu para ajudar no descarregamento. Quando terminamos, o “muchacho” nos levou a um lupanar onde tomamos uma rodada de cervejas. Eram 2:00 da manhã. As meninas de vida difícil se aproximavam perguntando “...donde vieram...? ...para onde van...?”  Mochilas às costas, partimos em busca de um canto tranquilo para dormir um pouco, não sem antes pegar  o registro do motorista em nosso Livro de Bordo, um expressivo cartão de visitas.
Num  banco de praça fomos acordados com um “Encantado... Yo soy hippy y...”.  de um rapazola argentino. Eram quase 3:00h. Argumentando cansaço adormecemos novamente, enquanto o jovem ficava de vigia. Um bom garoto. Mais tarde, às 6:00h nos despertou pois a sua turma da qual se desgarrara,  ia chegando. Duas meninas e outro rapaz . Uma das meninas, chilena, era conhecida do Lauro e foi um encontro festivo. Todos os quatro caracterizados como hippies. Depois das despedidas saímos à procura da sede da ACM (Associação Cristã de Moços) que em espanhol chama-se Associación Cristiana de Jóvenes.
Quando a ACJ abriu as portas fomos os primeiros a entrar. Identificados, tomamos uma boa ducha e trocamos de roupa. Agora, sim, estávamos  em condições de conversar com a direção do órgão. Uma conversa amigável mas o problema de primeira ordem persistia: a alimentação, já que a ACJ não possuía cantina. Poderíamos pernoitar o tempo que fosse necessário. A refeição desse primeiro dia foi patrocinado por um dos dirigentes. À tarde, contatamos um jornal identificado com as causas da juventude e demos uma entrevista, com fotos, a ser publicada semana seguinte.
No outro dia e os posteriores, percorremos residências a procura de trabalho em troca de comida. Sem sucesso. Os estômagos já davam sinal de vida quando uma menina assim, como diria, não muito magra, associada da ACJ nos trouxe uma panela com uma comida típica paraguaia. Ela estava caidinha pelo Carlão;  o Lauro e eu fazendo uma baita torcida para o namoro firmar. ...Ali estava a garantia de conhecer os pratos típicos, pô. O  paquerado  negou fogo alegando não gostar do porte físico da candidata. Não resolveu questionar: “...boniteza não põe mesa, cara...” A resposta era sempre  “Vocês viram a cinturinha dela...?”
Infelizmente o namoro não passou daquela caçarola.
Descobrimos uma festa de aniversário de uma  patrícia, à noitinha. E tivemos uma surpresa pois a família apenas falava português. Já absorvera os costumes locais. Onde já se viu festa de aniversário sem uma bebidinha?  Mesmo assim ficamos tipo adolescentes,  dançando rock  à base de refrigerantes... paraguaios!

                                                                                                                                      Continua... 










DO MORRO DA GUIA...   ---
08 - CATARATAS DE FOZ DO IGUAÇU
Foz do Iguaçu. Pães, frutas e conservas em lata foi o lanche que levamos para a caminhada até as Cataratas; a distância é de cerca de 28 Km, e nós conseguimos apenas duas curtas caronas. O percurso dessa vez foi quase todo feito a pé. A estrada pertence ao Parque Nacional de Iguaçu. È fechada, com muito verde e com uma fauna variadíssima: vimos tucanos, macacos, capivaras e principalmente borboletas (milhares) participando vivamente da ornamentação do ambiente. A trilha foi extremamente cansativa porém a cena divinal que se descortinou a nossa frente, fez com que esquecêssemos a estafa. Até nos levou a cometer pequeno  poema: Iguaçu.
            Ruído eterno de muitas dores
            Soluço incansável em busca  imorredoura
Em borbotões, lá vai o rio  e
Lado a lado vai o homem
Imitador na sua pressa e correria.
Distinguem-se não no choro , nem na dor
Sim no rumo.
Homem ignora para onde correr
Rio marcha resoluto às cataratas
A mostrar beleza aos tolos.
JPC
           
Por ser período de baixa temporada, percorremos com facilidade toda a área. O mais bonito e impressionante salto é sem dúvida o de nome mais assustador: Garganta do Diabo. Para conhecê-lo melhor, decidimos explorar o rio de perto, o que só foi possível porque  estava baixo. Caminhando pelo seu leito observamos o dito salto bem próximo, de baixo para cima. E nadamos em suas águas geladas. Transparentes.  A seguir iniciamos a caminhada de volta à cidade. Tínhamos um bom preparo físico.
O turismo em Foz do Iguaçu, ao contrário de Guaira, era  bem fomentado.  Nas cataratas os caminhos eram limpos, escadas e pontes seguras, sanitários públicos  bem cuidados e os elevadores  com turistas, na maioria,  estrangeiros. Já naquela época contamos vinte e seis agências de turismo.  Em Cabo Frio, zero.
Mais um dia se foi. Estafante. Às 23:00h estávamos na cama, numa pequena pensão.
25/09 – 4ª Feira. Pulamos cedo dos lençóis com os espíritos preparados para enfrentar as surpresas do asfalto. Próxima meta  Assunción, a capital guarani. Nos encaminhamos à Prefeitura uma vez que o prefeito nos prometera conseguir transporte. Eram quase 12:00h e nada. O homem  não aparecia. Lanchamos e voltamos. Nada. Eram 15:00h quando decidimos partir ao encontro da sorte. 
A poucos passos dali um caminhão com placa de  Assuncion nos deu carona. Na Ponte Internacional da Amizade que divide os dois países, carimbamos os passaportes. Na verdade eram dispensáveis; a identidade seria suficiente. Só que a nossa vontade era de inaugurá-los. Mandamos um “muchas gracias” ao funcionário da alfândega e subimos à carroceria do caminhão carregado de pilhas elétricas.
                                                                                                          Continua...












DO MORRO DA GUIA... --

07 -  O SALTO DAS SETE QUEDAS (Continuação)
Logo a frente veio a compensação por todo o esforço: uma pequena cascata onde foi possível nos banhar e revigorar as forças.. Mais meia hora sobre rochas escorregadias e chegamos ao Grupo 14. Conseguíramos! Um espetáculo magnífico! Quase indescritível. Milhões e milhões de metros cúbicos de água despencando pesadamente e provocando um ruído ensurdecedor. A espuma efervescente emoldurava a tudo, tendo como fundo  um arco-íris gigantesco, eterno.
Sentados em um platô, cara a cara com o Grupo 14, permanecemos muito tempo em silêncio, abestalhados, sem saber o que admirar. Cores? Ruídos?  Neblina? Obra? Artista? Como diria Sartre, "...as palavras perderam o sentido".
No retorno, para evitar o paredão de 90º, demos uma grande volta e passamos por outra dificuldade. Saltar de uma rocha à outra cuja largura do abismo tinha cerca de 3 metros.  Por absoluta falta de espaço o salto teria que ser dado sem tomar impulso. Salvaram-se todos. Atravessamos novamente dependurados no “laço” e depois de desarmá-lo, prosseguimos até atingir o segundo desfiladeiro, aquele com cabos de aço e a caixa de madeira. Na ida, ficáramos dentro da caixa, mas agora o Hermes testava nossa coragem:
- Quem vai atravessar comigo, andando sobre os cabos?
- Todos!
O material –roldanas e cordas-  foi colocado na caixa e fomos caminhando, devagar, por sobre os cabos de aço,  em paralelo.  Pisando no inferior e nos apoiando no cabo  de cima.  E empurrando a caixa.  Nós e  nossos anjos da guarda estávamos extenuados.
Chegando à cidade, fomos tomar umas caipiras. Merecidas. Pouquíssimas pessoas conheceram esses lugares.  E não conhecerão jamais por conta do lago da  Barragem de Itaipu.
Domingo. Na parte da manhã visitamos um museu de pássaros empalhados e artigos típicos da região. Fomos à Casa de Turismo, idealizada e dirigida pelo  Ernesto Mann. Amante de nossa terra e entusiasta como poucos pela natureza. Conversamos animadamente durante horas. Na despedida fomos ofertados com um belo livro de registro e fotos do Parque.  À noite,  fomos a um baile de estudantes em um  espaço pitoresco e acolhedor. Dançamos e namoricamos com as nativas até altas horas. Dia seguinte: despertar, arrumar as mochilas e almoçar rápido, foram providências necessárias para alcançar o ônibus de volta a Foz do Iguaçu.  A Casa de Turismo, de última hora,  nos presenteara as passagens.
                                                                                                          Continua...











DO MORRO DA GUIA À... --

06 – SALTO DAS  SETE QUEDAS
O dia amanheceu bonito e convidativo. Fizemos os preparativos e partimos em direção ao rio. Eram 09 horas. A estrada seguia lado a lado ao rio e a vegetação que a margeava era de um verde intenso. Vez em quando surgiam imensos bambuais. Caminhamos mais ou menos 04 km até chegar ao Parque Nacional e lá vimos todas as quedas possíveis, atravessando velhas pontes pênseis, de madeira, à procura de bons ângulos para fotos. Porém, para alcançar o salto denominado Grupo 14, o mais bonito, existia só uma maneira: por balsa, numa viagem excessivamente longa e vagarosa. A outra alternativa seria por ponte, mas em função de uma enchente em época remota, agora restavam só os cabos de aço que serviam de sustentação. Vimos o Grupo 14 de longe. A travessia era inviável. Mesmo?
Retornamos à Administração e um dos funcionários se ofereceu para guiar-nos por caminhos diferentes, fora da rota turística. Chamava-se Hermes. Depois de providenciar cordas e roldanas, recomeçamos a marcha pelo matagal a dentro. Chegamos a um abismo onde, outrora, existira uma ponte. Agora, só  cabos de aço e uma velha caixa de madeira usada para transporte de materiais de manutenção. Essa caixa, de 2.00 x 0,80m, deslizava  pendurada por 4 roldanas sustentadas nos ditos cabos de aço;  entramos, nós três, enquanto o Hermes se equilibrava sobre os cabos e empurrava a caixa.  A altura do abismo era de uns 50m aproximadamente e a largura tinha cerca de 80m. A adrenalina a mil.  Medo? Sem dúvida.
Do outro lado do desfiladeiro caminhamos sobre restos de corda e madeira e um emaranhado de cipós, vestígios da antiga enchente. Adiante, como por encanto, surgiu outro abismo mais assustador que o anterior. No local, esticado de uma a outra margem apenas um único cabo de aço. Ali, o Hermes instalou a roldana e passou uma corda, fazendo uma laçada, tipo balanço de criança. Um a um passamos todos: sentados no laço, seguro por uma das mãos e com a outra “puxando” o cabo, provocando o deslocamento do próprio corpo. E assim, como um pêndulo, seguíamos pendurados na simples roldana até a outra borda.
Vencido o desfiladeiro, prosseguimos sobre pedras, mato e pequenos charcos. Então, 3 ou 4 km depois, reencontramos o rio, apressado e incansável, e o seguimos ombro a ombro. Mais adiante, surgiu um enorme e vertical paredão de basalto. O guia parecia um cabrito montanhês e nós, pobres praianos, procurando seguir-lhe. Lembro-me que em dado momento fiquei paralisado, grudado ao paredão de 90º e pensei em desistir. Mas como? Olhando para baixo vi, a uns 20m, o rio que passava ligeiro e feroz. “O que estou fazendo aqui...?”, pensava  nisso quando o Hermes deu-me a mão e ergueu-me, na raça; eu próprio não poderia ajudar em nada. -

                                                                                                                      Continua...

quinta-feira, 30 de maio de 2013

CONTO  --

Dom Fradique de Toledo Osório    --  

Dom Fradique desceu do barco, olhou para o alto demoradamente extasiando-se com o cheiro forte do mercado de peixes, aquele cheiro que lhe era tão familiar, e sem expressar nenhuma emoção pisou a passarela que dava acesso ao cais. Deu uma olhadela discreta para trás observando a velha lancha branco-desbotado, com várias manchas de ferrugem no casco. Na proa, com algum esforço, ainda podia-se ler "Orgulho do Mar" em letras outrora douradas.
Sem demonstrar o menor sinal de enjoo pela viagem no mar encapelado, insensível, D. Fradique desceu o pranchão em direção à terra.
Enquanto atravessava a passarela pude reparar: passo cadenciado, cabeça levantada, nobre. O olhar deixava transparecer, para quem o conhecia bem, um certo cansaço mas o porte sempre altivo como se todos e tudo não tivessem o mais insignificante sentido. Ele sempre fora objetivo: o importante era chegar ao destino.
De longe, outro lado da rua, eu acompanhava seus passos. Já não era o mesmo, lógico, afinal haviam-se passado alguns anos e seu andar cuidadoso tentava mascarar uma firmeza de anos antes. Um pouco mais gordo, é verdade; o orgulho igual. O meu amigo D. Fradique de Toledo Osório vindo morar comigo em definitivo e eu me contendo para não correr em sua direção e abraçá-lo, beijá-lo efusivamente. Ele que havia sido em minha mocidade o meu "segurança" , o guru de nossa turma. Relembro-o alegre, espontâneo, disponível, companheirão, e mais que tudo, leal.
- Dom Fradique !   Gritei da varanda de casa. Ele girou o pescoço como um  guindaste, ereto, do seu jeito, dominando já o ambiente. "Dom Fradique de Toledo Osório" , repeti de modo pausado; ele olhou em minha direção parecendo ter-me localizado. 
Faziam seis anos que não nos víamos. Anos atrás e viria disparado, como das vezes em que me saltava em cima, jogando não-sei-quantos-quilos sobre o meu corpo.  Ficava tão excitado que às vezes se urinava todo. Fosse antes, me beijaria desajeitado e carinhoso como só ele.
Mas agora... Notei o seu olhar, como se pedindo desculpas por ter envelhecido. Estando já próximo escapou-me um "vem cá..." tão comovido que ele, juro, parece ter sorrido docilmente e foi-se chegando devagar, sem nenhuma vibração, como se nunca houvesse se afastado daqui de casa. Olhou-me fundo, lambeu-me a mão, sacudiu de modo lento a cauda e deixou-se ficar aqui junto a meus pés, sem afetação, deitado, quieto. Por certo o instinto avisando-lhe da brevidade de seu fim e ele querendo, apenas, ficar ao lado de seu mais amigo. Nada mais que isso.
Não sei... mas poderia jurar que seus olhos amarelos  também lacrimejavam.

JPC


POESIA A ESSA HORA...?     --


...SEM RUMO

mata sem ramo
canoa sem remo
eu que não rimo
César sem Roma
vida sem rumo.

JPC





POESIA A ESSA HORA...?    --

Desencanto

Hoje,
logo de manhã,
Alberto Caeiro deixou-me pensativo
e infeliz.

Como estou triste, José
como estou triste, Bob
como estou triste, Pietro
como estou triste, Fritz
como estou triste, Riman
como estou triste, François
e mais todos vocês
tristes do mundo inteiro.

Pelo barco que naufragou
pelo cachorro que morreu
pelo amor que acabou
pelo filho que adoeceu
pela própria alma que murchou
pela constatação de sua inutilidade.

Hoje, logo de manhã,
tive ímpetos de sair
e sem rumo
rumar pela vastidão das calçadas
dos mares e dos bares
das ferrovias,
com a mochila contendo apenas
a escova de dentes
e Fernando Pessoa.

E, com a braguilha
agressivamente desabotoada
escrachar atitudes civilizadas 
e comportadas.

Parabenizar administradores 
corruptos e astutos,
saudar as prostitutas decadentes de Paris
saudar os seus filhos de Viena
saudar os gigolôs da Via Veneto
saudar os tarados de Frankfurt
saudar os drogados de Amsterdam
saudar os agiotas universais.

E, pelos becos da noite
junto ao mendigo
partilhar o seu pedaço de pão,
junto a escroques, 
pederastas passivos e ativos
comparar nossos medos,
junto ao bêbado mais bêbado
brindar nossos fracassos.

Hoje, 10 de julho de 1984,
ainda na cama,
qual ejaculação prontamente contida
uma lágrima precoce
estancou retida na pálpebra.
Secou.
                                            --- ---
JPC


CONTO ---

UMA AVENTURA EM MACEIÓ    ---


Aniversário da namorada. Festinha despretensiosa, poucos convidados, não mais de quinze. Exceto uma velha amiga, ele conhecia a todos. Essa amiga, Teca (Tereza), natural de Palmeira dos Índios o remetia a um contemporâneo do exército, também natural daquela cidade. Colega de alojamento, cama vizinha, trabalhava na cantina e um dia oferecera uma lata de ameixas em troca de uma cerveja. Aceitou e em seguida se arrependeu: aquilo cheirava a furto na cozinha. Nunca mais esqueceria do  fato.
A conversa entre as amigas esticava-se animada: antigos colegas, namorados, faculdade, por aí afora. Assim que surgiu uma chance, foram apresentados. A Silvia trouxe a amiga pela mão. “Este é  meu namorado... o Ryd”. Beijinhos e cumprimentos de praxe.
- Ryd é apelido...?
- Não. Ryd Naruj; homenagem a um poeta indiano. “E por que Palmeira dos Índios?”.
- Ora, “minha terra tem palmeiras...” e índios.
- Mas apenas uma palmeira...! e quantos índios ?
- Sabe que nunca havia pensado nisso ? Vou pesquisar. Tem um cigarro aí...?
- Deixei de fumar há mais de dez anos. Cigarro mata.
Enquanto a Silvia dava atenção à festa trocando CDs, providenciando gelo, essas coisas... o Ryd papeava com a Teca que  era danada de bonita. Toda clara; pele, cabelos e olhos  claros.
- Você bem poderia chamar-se Clara...
- É claro... retrucou sorrindo e apertando os olhinhos. “Eu e a Silvia somos velhas amigas, acho que desde a creche.  Depois nos perdemos por aí, e há três anos não nos víamos”.
- Maceió não é tão grande assim, disse ele. Para uma boa amizade é muito tempo, não acha?
- Creio que foram os casamentos, a gente acabou se afastando.
- Você é casada? Tão nova...
- Vinte e três anos...
- De casamento?  (rsrsrs)
- Ôxe...!   (rsrsrrs)
- Filhos?
- Felizmente,  não.
                                                                                                                                    

Alguns convidados se aproximaram, e ele chamou a namorada para dançar.
Mais tarde, na brincadeira que surgiu na sala, os casais trocando de parceiros... E quando deu por si dançava sozinho. Silvia e Teca papeando na cozinha. Cabeça meio zonza, teve certeza que o vinho não era dos melhores mas como havia iniciado com ele evitou misturar. O som rolando solto.
Passava das duas da manhã, os amigos se retiravam pois dia seguinte, ou melhor, pela manhã –segunda feira-,  iriam trabalhar. Agora, rendera-se e tomava um uísque  enquanto dançava solitariamente uma balada country. Silvia, no elevador, despedia-se de retardatários.
- Estou indo, queridos.. .Disse Teca.
Indagada se estava de carro, negou: “Nâo, ficou com o maridaão”.
- Preto –era o Ryd- “Dá uma carona para a Teca; de ônibus o filtro não chegará inteiro..."
A Silvia havia pedido  à  amiga para levar um velho filtro de cerâmica que seria doado à uma instituição beneficente. Frustrado, já que havia planejado passar a noite com ela, beijou-a e saiu atracado, literalmente, com o filtro.  Comemorariam o aniversário, em particular,  dia seguinte.
Saíram. Ao entrar no elevador é que se deu conta que o filtro era mais pesado do que parecia. Sua cabeça também. “Vinho e uísque, mistura demoníaca...”, lembrou-se do velho amigo Barão.
Dirigia devagar pela orla. Na carroceria da picape, o vaso tentava se equilibrar. Na cabine, o tema: relacionamentos, encontros, desencontros, encantos, desencantos. Teca enaltecia a Silvia: excelente mulher, bonita, alegre, resolvida. Resolvida? Muito ciumenta, corrigiu ela. Mas uma tremenda guerreira que numa precoce viuvez, filhos, faculdade completada com certo atraso tinha, no entanto, merecidamente, a sorte de encontrar um homem bacana como ele.
- Sim, você... um cara interessante, certo charme...
- ...Peralá. Já me viu de pé? Reparou na calva? Na barriguinha...? Ah, já sei... misturou vinho com uísque...
O rumo da prosa o incomodava. Lembrou-se de imediato do Raimundo. Há um ano, quando chegara a Maceió o seu amigo, alagoano, entre copos de cerveja e garfadas de buchada de bode, dissera-lhe:
- Ryd, você está gostando daqui...? Pretende ficar?
E diante de uma afirmativa: “Ótimo.  Preste muita atenção.  Não estamos no Rioestamos em Alagoas. Aqui não existem ladrões, exceto os graúdos. Vão presos? Não sei, só sei que desaparecem. Aqui não se briga no tapa. É buraco de faca ou tiro. Significa dizer que pode se divertir, dançar forró, namorar à vontade mas ouça bem: nunca com mulher casada. Aqui, marido corno não perdoa, mata. Ou manda matar”.
                                                                                                                                    

- ‘Tá pensando em quê ? Ela interrompe os conselhos do Raimundo.
- No filtro... será que esta inteiro?
- Está gostando dela, não esta...?
- Da Silvia? Me amarro naquela morena.
- Mas você teria coragem de dar uma saidinha com outra ? Só uma saída, sem compromisso?
“Isso é armação” Sua cabeça rodava um pouco mas ainda podia raciocinar. “Essa miserável esta mancomunada com a Silvia. Aquele papo  comprido na cozinha...”
- Não... Estou feliz com ela e não pretendo comprometer a relação.
A Teca continuava insistindo naquela conversa de cerca lourenço. De repente:
- Dá uma paradinha por aqui. A minha casa fica logo ali na esquina.
- Eu vou carregar ao filtro até lá?
- Não desconverse... Olhe, não estou nada a fim de ir dormir... Vamos tomar uma saideira. Só uma.
- Ô Teca... Não é correto ficar desfilando por aí com você, mulher casada, certo?
- Certo. Então vamos para um lugar sossegado... Quem sabe... um motel. Só pra conversar!
Aí o Ryd ficou preocupado. “Essa mulher é louca... Será que esta chapada...?”
- Escute... é tarde e eu preciso levantar cedo. Às seis tenho que estar de pé. Tem navio no porto.  E outra: No motel... só pra conversar...???
Sentia-se desconfortável. Um verdadeiro martírio. Nunca havia recebido uma cantada assim, explícita. Nervoso, não tirava os olhos da calçada e dos retrovisores. Também, pudera: a picape parada a dez metros da casa da maluca. E mais: o pensamento nos conselhos do Raimundo enquanto ela desfiava seu rosário de desventuras: casamento fracassado, o marido não a procurava... Talvez até tivesse amante.
- Pode uma mulher como eu ser rejeitada? Seja sincero.
- Não! Claro que não. Não, é claro!
- Com o corpo todo durinho... Olhe só...
Disse isso enquanto pegava a sua mão e a colocava no seu busto. Ele pirou “Isso não pode estar acontecendo comigo... merda, todo mundo já disse isso”.
Ele colocou a ponta do dedo  em seu peito esquerdo. “È mesmo... Que coisa, né?”
                                                                                                                                                  

-“ Você esta brincando!”  Falou ela abrindo a blusa devagar, os seios saltando, melhor, saltitando à sua frente.

- Ainda não deu sua opinião sobre meus seios... 
- São maravilhosos, mas...
- E gostosos! Teca fechou os olhos, puxando sua cabeça em direção ao peito.
- “...tô morto”, pensou,  enquanto  manobrava o carro e partia à caça de um motel.
                                      ----------               
Ela foi ao toalete. Ryd sentado no canto da cama, de cuecas, uma tremenda dor de cabeça, misto de tesão e cagaço. Mais cagaço.
- O que foi? Esfriou? Perguntou ela ao sair do banho.
- Você havia dito que a Silvia merecia ser feliz... Isso estaria incluído?
- A minha amiga que me perdoe mas eu também mereço um pouco de alegria...  Terminou a frase já enganchando sobre ele.
E ele?  Ele, nada. Brochada federal. Veio o conforto: “Isso acontece... não esquenta...”  Ele levantou, foi ao banheiro e tomou uma ducha fria. Não resolveu o problema de todo. Só meia bomba,  45 graus, suficiente para um desempenho, como direi,  sofrível.
Despidos e recostados à cabeceira da cama, amargaram uma silenciosa frustração. Alguns minutos de aparente quietude e, de repente, no escuro do quarto notou quando ela pegou a bolsa e retirou alguma coisa que brilhava. Ao virar-se  pode confirmar: uma pequena pistola, cromada. “Merda, isso não pode estar acontecendo...”  (É a segunda vez que falo isso... um clichê).
Naquele momento, lembrou da Silvia, da mãe, dos filhos, do cachorro e, principalmente, do Raimundo. “Pô, Raimundo, você errou... Não é o marido quem mata, é a própria ...”.
Os pensamentos foram interrompidos pelo desabafo:
- Hoje, acabo com tudo...
A pistola apontada para o umbigo dele. Sem tirar os olhos de seu dedo indicador, tentava manter-se tranquilo, falando calmamente.
- Cuidado, Teca... Isso pode matar alguém...
- Não creio. Pode agredir alguns órgãos mas não mata...
Dito isto, apertou o gatilho e ele deu um salto. Na verdade, não foi bem um salto, foi um solavanco; mas não ouviu o estampido. Ao invés do projétil saiu uma pequena chama que ela levou até o cigarro.  E continuou com a lamúria:
- Hoje tomo coragem e acabo com esse casamento fajuto.
- Graças a ...
- O quê ?
- Graças a Deus você tem cigarros...]
- Iche.. .cê disse que não fuma...
- Não sei porque mas agora me deu uma puta vontade de fumar...

O filtro de barro...?  Que pena!  No quebra molas, na saída do Motel, trincou de cima a baixo.

                                                                           ---- ---- ----
JPC                                                                          

terça-feira, 28 de maio de 2013

ESPAÇO DOS COLABORADORES --

CRÔNICA --

O olhar do caminhoneiro



Ana morava em Ingazeira da Serra, cidadezinha pequena no sertão de Pernambuco. Desde que tinha nascido, 16 anos antes, Ana morava na mesma casa, dormia no mesmo quarto, e diariamente olhava pela mesma janela a rua de pouco movimento e a praça de uma árvore e nenhum banco. A vida era assim em Ingazeira da Serra: de manhã ir no grupo escolar, de tarde ajudar em casa e se debruçar na janela. Pela janela, ora de olhos abertos, ora de olhos fechados, ela sonhava com a vida, com outra janela, com outra vida.
Numa tarde quente que nenhuma folha se atrevia a mexer, Ana abriu os olhos que sonhavam na janela e ao invés de ver sua praça e árvore, viu uns olhos castanhos e meigos de um caminhoneiro que passava em frente. Eram os olhos de Pedro. Ele reduziu o motor, e continuou seu caminho com seus olhos ligados aos de Ana, que não piscou, não sorriu, não se moveu. Quando o caminhão sumiu na esquina, Ana fechou os olhos e quis chorar. Não chorou. Ficou com os olhos fechados, apertados, fazendo força para controlar seu coração que batia pela primeira vez. Ana abriu os olhos e seu coração quase parou de vez ao encontrar novamente aqueles olhos castanhos que a olhavam doce e intensamente. Ela não sabia o que fazer, mal respirava, quando Pedro sorriu. O doce do seu sorriso a amargou a alma ao pensar que ele partiria. E ele se foi. Colocou o motor em marcha e sem perder o visgo do olhar foi se afastando lentamente até virar na esquina. Nesse momento Ana sabia que ele iria novamente dar a volta no quarteirão para revê-la. Ana pensou que iria morrer; seu coração tinha uma batida doída, latejava, a boca estava colada e as pernas tremiam. Quando escutou o motor chegando ela estava paralisada e radiante, lindamente emoldurada pela janela azul. Sem perder o olhar, Pedro parou o caminhão, desceu, caminhou através da rua e parou o mais perto possível. A voz não queria sair, mas ele disse:
-  Como você se chama? ...num sussurro ela conseguiu dizer “Ana”.
-  Eu me chamo Pedro. Ana, você quer vir comigo? Pra sempre?
Depois da resposta o caminhão não virou a esquina, e lentamente seguiu pela rua vazia. No entanto, antes de sair da cidade, Pedro parou na delegacia   para informar ao delegado que a moça o acompanhava por vontade, que ele não estava roubando ninguém, e que homem direito que era, logo iriam se casar.
Casaram, tiveram filhos, netos, e bisnetos, que até hoje carregam nos seus olhares a busca por novas janelas.
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Claudio Miguel da Costa Neto

DO MORRO DA GUIA...    --   

05 - GUAIRA

Curioso registro: Início de viagem:11/09; chegada: 17/09 =  7 dias.                                              

Levando-se em conta o modo peculiar da viagem e descontando-se o tempo que permanecemos em Curitiba, tivemos em excelente rendimento: Cabo Frio/Foz do Iguaçu em 4 dias.
Estávamos a exatamente 330 km de Assuncion, Paraguai, mas ficou decidido não atravessar a fronteira. Iríamos conhecer primeiramente o famoso Saldo das Sete Quedas. Depois, as Cataratas e só depois atravessaríamos a Ponte Internacional da Amizade. A  ponte que separa o samba das guarânias.
A estrada que liga as duas cidades era totalmente deserta. (Se fosse à  base de caronas não chegaríamos nunca).  É uma terra roxa que encarde as roupas e penetra nos poros. No trajeto vimos muitas cidadezinhas paradas no tempo; vinte casas, uma capela e um campinho de futebol, sem as mínimas condições de progresso. A vegetação que margeia a estrada é selvagem e marca o princípio das florestas mato-grossenses. O único contato que fizemos nesse longo trajeto foi com dois vendedores viajantes extremamente comunicativos.
Anoitecia quando chegamos em Guaira e, mesmo assim, saímos à procura do Major Comandante do Regimento local que nos alojou numa casa da Vila dos Oficiais. Tomamos uma boa ducha, lanchamos e fomos ao cinema do quartel. Passava “Matar ou Morrer”, com um Gary Cooper ainda jovem. Em seguida vimos um jogo de futebol de salão. Tudo isso ciceroniado por um jovem tenente. “Guia” foi o termo usado pelo Comandante mas notamos que o tenente estava preocupado em nos vigiar de perto. O Major Getúlio, espirituoso e grande piadista, na verdade agia com precaução com relação a nossa presença.  Para nós era indiferente. Queríamos apenas conhecer novas cidades, culturas e gente diferentes. Dia seguinte, finalmente conheceríamos o Salto das Sete Quedas.
Logo cedo, obtivemos na Secretaria de Turismo as informações que queríamos a respeito da cidade e particularmente sobre o Salto. Como o tempo estava nublado adiamos a visita para outro momento.
No quartel fomos avisados que chegaria uma visita importante, creio que um Comandante de outra cidade,  e que ocuparia a casa em que estávamos hospedados. Fomos transferidos para um hotel no centro da cidade. Cheirava a pretexto para nos afastar do quartel e nesse momento acreditei que estávamos com aparência suspeita.  O hotel, como todo o comércio,  chamava-se  7 Quedas.  Chovia muito, o que nos forçou a adiar para o dia seguinte o plano de conhecer as cascatas.  -- 

                                                                                                                           Continua...


DO MORRO DA GUIA...   04 - FOZ DO IGUAÇU   --

Hoje é 17/09 e estamos completando uma semana de viagem.  Não  conseguimos dormir nesse trajeto empoeirado e esburacado. Eram 6 horas da manhã e  os termômetros marcavam 5 graus. Pela primeira vez na vida estávamos experimentando tão baixa temperatura.    Bbrrrrr. Nem leite quente com conhaque resolveu.  Ficamos esperando o Rei sol aparecer, mas quando ele veio tinha cara de plebeu, fraco e tímido.
Cascavel se parecia muito com aquelas cidadezinhas dos faroestes americanos. Nas portas dos bares, cavalos aguardando seus donos. Lá dentro, homens de botas, chapéus e até... revólveres.  Ao caminhar pelas ruas avistamos de longe a redação de um jornal. Adivinhem qual?  O mesmo de Guarapuava: TRIBUNA DO PARANÁ.  Em seguida às apresentações, mostramos o recorte da reportagem de Curitiba e nossas carteiras de “Colaboradores” da Folha dos Lagos, da época do Sr Walter Nogueira da Silva)  o redator nos deixou à vontade e resolveu o principal problema. Passagens de ônibus para Foz do Iguaçu.
Trazíamos do redator do Jornal, endereçadas ao Comandante do Batalhão de Fronteira, várias  fotos de uma solenidade realizada  e anexadas a uma reportagem da TRIBUNA. 
18/09 – Estamos em Foz do Iguaçu, aquela cruzinha vermelha marcada no mapa; a primeira grande etapa estava cumprida.  Dormimos num pequeno hotel que tinha convênio com a TRIBUNA e depois do  café fomos à procura do quartel do Exército. Faríamos entrega da encomenda (um envelope com fotos e recortes de jornal) ao Cel.  Arídio, Comandante do Batalhão de Fronteira. Frustração:   o Coronel havia saído. Que fazer?  Bater pernas.  A caminho do  Rio Paraná topamos com um barzinho que servia um PF respeitável por precinho maneiro. Para comemorar, nos demos o luxo de tomar uma garrafa de vinho. Daqueles, mas com sabor de francês. Afinal estávamos realizando um sonho de criança, conhecendo Foz de Iguaçu. Dia seguinte  íamos  conhecer as Cataratas.  Felizes que nem crianças, pulamos no rio.  O saldo de caixa –para emergências- agonizava.
Às 18:00h falamos com o Cel. Arídio em sua residência, na Vila Militar, tendo o mesmo ligado para o quartel ordenando que nos acolhessem. Fomos otimamente recebidos nesse regimento; deram-nos um apartamento –privativo do pessoal da FAB- e avisaram à cantina sobre a nossa presença. Tudo isso graças à influência da imprensa da região. Após o banho e o jantar, o Lauro Faria  saiu para uma volta; o Carlão remendou sua calça jeans e eu aproveitei o tempo pondo em dia as anotações do Diário de Bordo.  -- 

                                                                                    Continua...                                                     


POESIA A ESSA HORA...?

PELA VIDA ...

Cheio de embaraços
caminhando a passo e passo,
buscando seguir o traço,
-inquieto em meu espaço-
pela vida a fora eu passo.

Passo por ela
ou ela por mim?

Se é ela que passa
que vai, se esfumaça
descansarei meu cansaço
chorarei por meu fracasso
esperando, sem pressa, o fim.

JPC

segunda-feira, 27 de maio de 2013

CASOS 
NO TEATRO  --   O conde
Por força de doença de um ator,  improvisou-se  um rapazola para uma cena numa peça de época. Como o papel era muito curto e sem texto, fácil, não seria problema a convocação de última hora.
O Diretor havia explicado calmamente o que ele faria:
- Você será o Conde. Vai entrar em cena e ficar ao lado da Marquesa (apontou a loura...), permanecer dois minutos e sair. Só isso. Não vai falar NADA. Entra mudo e sai calado... entendeu?
- Sem “pobrema”.   Respondeu o rapaz,  entusiasmado.
E ficou de lado,  nervoso,  pensando na pose, na postura, aguardando ansioso a sua hora.
No momento de entrar, o “ponto” o alertou: Olha, o conde entra mas não fala,  e o empurrou pra dentro do palco.
A  grande promessa shaksperiana de ator, adentrou o cenário, estufou o peito, limpou a garganta e ...

- O CONDE ENTRA MAS NÃO FALA !!

Pano rápido.


domingo, 26 de maio de 2013

CASOS DO TELMO --- COMUNICA OU NÃO COMUNICA? -- Em certa reunião num restaurante no bairro da Ogiva, área chique nos anos sessenta, presentes o prefeito e outras autoridades, eram discutidos planos e idéias para o desenvolvimento turístico e cultural da cidade. Várias baboseiras eram colocadas em questão. De saco cheio, Telmo Mesquita, projetista, a tudo ouvia, introspectivo, degustando o seu vinho entremeado com goles de uísque (mistura demoníaca, segundo ele próprio), quando em dado momento um cidadão de origem italiana, comerciante local, argumentou sobre a necessidade prioritária do comércio qualificar-se com aprendizado de outros idiomas: italiano, espanhol, inglês e outros, uma vez que a língua portuguesa “não comunicava bem”. Pronto. O Barão, já levemente alterado, vira-se para o italiano e de modo gentil mas direto exclama: " Por que o senhor não vai para ...? " (Bem, vocês imaginam pra onde, não?) Silêncio. Constrangimento geral. Por longos segundos o clima remetia a velório. Foi quando, levantando-se da mesa, o Barão falou claro e pausadamente: - Comunica ou não comunica...? E, com um sorriso sarcástico, escafedeu-se. Risos generalizados, como pano de fundo. ----- ----- JPC
QUANDO A LENDA É MAIS FORTE QUE O FATO, PUBLIQUE-SE A LENDA...  ("O homem que matou o facínora" - John Ford - 1962).                    Por isso vamos aos casos da terra...

 Foi num sábado à tarde, feijoada na casa do Amâncio Pé-na-Cova, na Passagem, no quintal à sombra de uma goiabeira. No panelão, uma senhora feijoada, completíssima: do focinho ao rabinho do porco; da farofa à laranja. Violão, pandeiro e faca no prato. Bolero, samba, valsa e chorinho. Trovas e poesias. Cerveja, pinga, uísque e outras coisas mais, na surdina. Imagine alguma coisa: havia. De repente, de dentro da casa ouvimos gritos, ai, ui, segura, péra aí, Nossa Senhora! Socorro...! Alguém chegou esbaforido alegando que o Amâncio havia endoidado, pirado de vez. O homem realmente estava brabo, possuído, quebrando cadeira, prato e até a sua mulher havia levado um chega-pra-lá na orelha. Foram necessários quatro ou cinco para imobilizá-lo, embora o homem não pesasse mais de cinqüenta quilos, magro que nem um mamoeiro. Houve questionamentos: “Birita com fumo não dá certo, não disse ? Que mané birita? Isso é coisa feita... Baixou o Caboclo, dizia outro. Só pode ser...!"   
 - Deixa comigo!! Gritou o Xisto Bahia Filho, primo do Telmo Mesquita que além de poeta, escritor e compositor, era sujeito destemido e, mais importante, já havia tomado umas sete coalhadas, no mínimo. - Deixa que eu tenho experiência com essas coisas... Dito isso adentrou a sala, agarrou o Amâncio pela cintura, suspendeu e o levou para o quarto, passando a chave. Silêncio lá dentro. Passaram-se alguns minutos, quinze ou vinte, e volta o Xisto bem calmo: “Tudo resolvido!” E pediu um samba do Cartola. - Mas o que V. fez? perguntaram.
- No pé-do-ouvido do Amâncio, falei pro Santo que “subisse, não enchesse o saco e que se não fosse embora, ... eu ia encher o cavalo de porrada”. 
 O Amâncio ficou tranquilinho, no ato.  
 J.P.C.
DO MORRO DA GUIA AOS ANDES... DE CARONA  -- 03 – AJUDA DA IMPRENSA -- Uma incrível coincidência ocorreu durante a estada em Curitiba e não podemos deixar de narrá-la. Na noite anterior o Carlos queria encontrar um amigo -do Rio- chamado Nicolau. Não lembrava do sobrenome e muito menos do endereço. Saímos às ruas perguntando a todos que por nós cruzassem. “Conhece o Nicolau?...” Motivos de riso, claro. Meia hora depois, o Carlos avistou um casal que se aproximava e correu em direção a eles. “Esta camisa é do Nicolau...”, gritou para o rapaz. E o pobre adolescente, apavorado, “É verdade... ele me emprestou”. E assim, desse modo absurdo, encontrou o seu amigo. Um novo dia. Com passagens de ônibus concedidas pela Prefeitura embarcamos em direção à Guarapuava. Eram 16:30h e líamos a reportagem da TRIBUNA a nosso respeito com a manchete: DE CARONA ELES VÃO AO EXTERIOR. Em Guarapuava nos dirigimos ao Quartel do Exército e após apresentação de documentos, revista nas mochilas e de ler a reportagem do jornal , o Oficial de Dia nos convidou a adentrar ao rancho. Alimentados, fomos conhecer o Comandante do regimento, um homem culto, amante das Artes e que nos indicou ao Prefeito local. Deste, ganhamos passagens até Cascavel. Como partiríamos à noite voltamos ao Quartel pois não era nada agradável andar à toa, de mochilas sob um sol forte e uma poeira vermelha e fina. O Comandante, Major Munhoz, ordenou que chamassem o Oficial de serviço e quando este chegou ouvimos o seguinte diálogo: - Tenente, faça as honras da casa pois tenho que sair. Os rapazes vão jantar com vocês no Cassino. Mande preparar tudo... Tomamos um bom banho; percorremos o interior do Regimento e a capela que, por sinal, merece um destaque: O Cristo, de madeira, num trabalho artesanal fabuloso. A Via Sacra, distribuída pelas paredes laterais era obra de um ex-soldado. O altar original, solto,” levitando” aos pés do crucifixo. Tudo muito simples e de extrema leveza. Chegou o momento de jantar. Antes porém de passarmos à Cantina tomamos um drinque com os Oficias, todos jovens e curiosos com os detalhes de nossa aventura. Em seguida fomos conduzidos até a Rodoviária. O relógio marcava 23:00h quando subimos os degraus do ônibus que nos levaria a Cascavel. -- Continua...

quinta-feira, 23 de maio de 2013

CRÔNICAS

OLHA A MERDA AÍ, WALDEMAR!

Mil,  novecentos e sessenta e poucos. Sábado, talvez  uma ou duas da manhã numa cidade deserta,  noite tranquila e sem vento, um pouco  quente e  a turma sem muito o que fazer.  Já faláramos das conquistas amorosas,  fizéramos  as  relações dos melhores filmes, melhores  atores,   piadas recontadas (Hamilton Rosa era o mestre)  e nós ali na praça Porto Rocha em frente ao Hotel Colonial,  a ponto já de irmos embora.
- Gente... Vocês viram a lua...?
- Caracas! (mentira: naquele tempo ninguém falava caracas).  Com certeza foi outra exclamação.
Realmente, a lua estava plena, divina, soberana, clareando  toda a praça inclusive as barracas de  Colé Colé e de Antonio Pemba.
- E a lagoa, já repararam...?  Um  mais  observador  chamou a atenção.
E lá fomos em direção à banca de peixes ver de perto  o reflexo da lua na lagoa,  paradona , um espelho.  Um espetáculo convidativo à interação.
A conjunção de noite quente, lua cheia e lagoa parada provocou espontaneamente  o desafio de dar um mergulho. Por que não?
Renato Lopes, Jacob Mureb, João Marcos, Everardo,  os neurônios não garantem  mas creio que  o  Tipi  também. Todos  caímos na água. Pelados. Completamente pelados.  Era um ir e vir incansável, do corrimão da banca para a água ,e vice-versa.
E na bagunça dos “fincões”,  “anjos”, “barrigadas” e “canivetes”, não deu para notar quando aproximou-se quem não deveria  aparecer.
- Sujou...! (2ª mentira: ninguém falava “sujou” naquele tempo.  Na verdade, foi “Olha a merda aí, Waldemar...!”)
De pé, no centro da banca, o inesquecível e único guarda-noturno da cidade, Sr. Zé Sampaio.  Braços cruzados,  havia juntado as calças, camisas e cuecas  num bolo só, junto a seus pés.
- Muito bonito, isso !!  Vamos saindo, já!
Entre encabulados e zombeteiros, subimos os degraus de acesso à banca com  as mãos cobrindo as partes pudendas (à  época inda se falava pudendas...).


E o “seu” Zé Sampaio continuou, agora com  caderninho e  lápis nas mãos:
- Vão dizendo os nomes, aí...
Nada. Silêncio absoluto.
Após algum tempo, já aporrinhado e pra encerrar o impasse, o  “seu” Zé Sampaio arrematou:

-Não é preciso dizer os nomes, não. Conheço todo mundo... Apontando para cada um, ia anotando e falando alto...  Para Tatá: “você  é filho de Macário; Para Có e Tipi “ Você são  filhos de Adib. ... Você é filho de João Nogueira; Você é filho de Mureb e você é filho de Claudio Nenêgo.
Fim da brincadeira. Fim de noite.  Lá  fomos nós, cada um para a sua casa. Molhados e felizes. Mais felizes.
Hoje,  a banca de peixes não existe;  o “seu” Zé e alguns de nossos amigos  já se foram.
Restaram  a lua e a lagoa. E a saudade, é óbvio.

JC
                                


DO MORRO DA GUIA AOS ANDES... DE CARONA -- 
A PARTIDA                                                                            -02-

10 de setembro de 1968. 15:00h. Fomos para a Cia. Salinas Perynas tentar um caminhão que nos levasse até o Sul do país, precisamente Curitiba, a nossa meta inicial. Nada. Pernoitamos em um abrigo de ônibus. Dia seguinte, cedinho, um FNM aceitou nos dar carona até o Rio de Janeiro.  Aceitamos de pronto já que a ansiedade em iniciar as andanças era grande. No Rio, inauguramos o Livro de Viagem com a assinatura do Mário, o motorista do FNM. Em seguida fomos em direção à Avenida Brasil e prosseguimos incansáveis (!) até a Presidente Dutra.  Caminhamos cerca de 25 quilômetros, o que atestava a nossa disposição. Dormimos numa obra de reforma de um motel depois de um lauto lanche: uma lata de salsichas e algumas laranjas, sobra do lanche da manhã. O café da manhã foi cortesia.
Três caronas, dois caminhões e um automóvel,  nos levaram até São Paulo. Dividimos 2 PFs  e não deu briga. Bom sinal.  A seguir atravessamos a cidade  num fusca  cujo motorista -Renato- era curitibano e,  entusiasmado com a conversa, nos levou ao início da BR 116, rumo ao Paraná.
Mochilas no acostamento e polegares no gesto de carona, parou um outro fusquinha conduzido por um homenzarrão com cara de aborrecido. Ao entrar no carro notamos a expressão de pitt-bull.  “Boa tarde!”. “Boa tarde!”.  Após alguns minutos puxamos conversa e ele se soltou. Tinha a voz fina, incompatível com o seu porte físico. E com o transcorrer da viagem, vimos que a pose de homem era só... pose.  
Descemos próximo a uma Patrulha Rodoviária e pedimos que carimbassem o nosso Livro. Logo ao sair da Patrulha encostou um caminhão vazio. Mostramos o Livro carimbado e assinado pelos policiais, e lá fomos nós. Ao anoitecer, nos acomodamos sob o encerado e a viagem seguiu tranquila enquanto cantávamos ou contávamos velhas piadas. Era alta madrugada  quando chegamos em Curitiba.  Cumprida a nossa meta inicial sob um frio de rachar. Esperamos o dia clarear e saímos a procura de Luis Francisco Vieira (Tachico) um cabo-friense que cursava  faculdade na capital. Após os abraços e um breve papo caímos na cama. Ficamos hospedados em sua república e as refeições eram feitas no refeitório da Universidade. Cortesia.
Era o terceiro dia da viagem -13/09- e dali em diante, como havia pouco trânsito nas estradas procuramos apoio na Prefeitura;  também visitamos o jornal “Tribuna do Paraná” que publicou   reportagem sobre a nossa aventura. A manhã seguinte surgiu cinzenta e chuvosa o que nos prendeu sob os edredons, até tarde. A proprietária do prédio –Sra. Lourdes- fez um bolo e alguns salgados para “comemoração” do aniversário de  Carlão que aceitou com ar feliz e comovido. A festa esticou até as cinco da matina. À noite visitamos um clube e  nos recolhemos cedo pois dia seguinte daríamos uma guinada rumo  ao  Oeste, onde conheceríamos  as Cataratas do Iguaçu em Foz do Iguaçu e o Salto das Sete Quedas, em Guaíra, fronteira com Mato Grosso.

                                                                                      Continua...




DOCUMENTÁRIO 

DO MORRO DA GUIA  À CORDILHEIRA DOS ANDES... DE CARONA.

                                                                                                                                                         -01-

1968, um ano emblemático. Nos Estados Unidos, fanáticos haviam assassinado Martin Luther King que lutava por Igualdade. Na França, estudantes agitavam as ruas em confronto aberto com a polícia, enquanto o resto do mundo acompanhava apreensivo o desfecho das escaramuças.  Aqui no Rio, em plena ditadura militar, os nossos estudantes demonstravam também a sua revolta com  passeatas e embates cara a cara com a polícia. Os inúmeros sindicatos decretavam greves. O pau quebrava nas ruas naquele ano conturbado.
Não era a época ideal para um grupo de rapazes sair por aí, de mochilas, a conhecer o mundo lá fora. Tínhamos (tínhamos?) consciência disso. Não éramos estudantes mas apenas jovens inquietos e  insatisfeitos com nossas ocupações e impetuosos o suficiente para, duros,  descobrir outros lugares e outras gentes.
O Lauro Faria e eu havíamos planejado o roteiro para um giro pela América do Sul. Roteiro este que, de acordo com o nosso conceito de aventura,  poderia ser mudado na primeira esquina. ...! Havíamos lido “Onde the Road” de Jack Kerouac recente...
A nossa experiência em pequenas viagens mostrava que o grupo ideal deveria ser de três pessoas. Convidamos então outro amigo: Carlos Eugênio Terra Ruckert.   Para sucesso da aventura seria vital o  perfeito entrosamento da equipe já que com mochilas e de caronas tentaríamos chegar ao Chile atravessando a Cordilheira dos Andes, após cruzar  Paraguai e  Argentina. Ah!...sem dinheiro. Exceto míseros NCr$25,00 (cada um) para situações de extrema emergência. Com os espíritos predispostos a enfrentar toda e qualquer dificuldade aceitaríamos as condições que a estrada oferecesse, por mais agressivas   e estranhas que fossem.
Munidos de  passaportes, arrumadas as mochilas e uma reduzida maleta de primeiros socorros, partimos para a estrada, o nosso elemento. De última hora resolvemos acrescentar  um material insólito:  tamborim,  pandeiro e um  minúsculo  atabaque, na verdade uma parte de um bongô.  No inconsciente, o espírito beatnick.
                                         
                                                                                                                                    Continua...