CONTO
ENCONTRO COM A JOAN
BAEZ
Eu
a conheci na década de setenta do século passado, em Cabo Frio. Na
verdade, nunca soubera de sua existência. Assim que chegamos, eu e uma amiga,
na casa do pintor José de Dome, no Portinho, toquei a
campainha e logo depois chega ele,
descalço –como sempre- com ar compenetrado e fazendo sinal de silêncio com os
dedos nos lábios. Na outra mão, pincel e espátula. Deixamos os
calçados no hall e caminhamos silenciosamente, nas nuvens, tal como se caminha ao
lado de um berço com um recém-nascido a dormir.
No
ar, em toda a casa, todos os cômodos e transbordando para o quintal e
também, suponho, subindo pelos galhos, pelas folhagens das
árvores, uma voz limpa, suave e poderosa, que sei eu...? divina. Não
entendia a letra da música, em inglês, mas fiquei meio que atordoado, como se levitando. Que coisa maravilhosa,
exclamei. Sshhiiii, ordenou-me o Zé.
Quando
acabou a música, com um largo sorriso, apresentou-me: essa é a Joan Baez.
-
Mas que merda, eu não falo
inglês... - Disse,
timidamente.
-
Não precisa.... só escute. - Retrucou
o Zé.
E
ela começou a cantar outra canção, e mais outra, e mais outra. Eu, embevecido,
melhor, abestalhado, sem entender patavinas. Apenas encantado, em
silêncio, saboreando a melodia, suas palavras -ininteligíveis para
mim- degustando o
momento. Raro momento: Zé de Dome encantando os nossos olhos com
as cores e ela encantando nossos ouvidos com a sua voz.
Trinta
anos, não, quarenta anos se
passaram.
Estamos
eu e minha filha em Paris, passando uns dias em casa de meu
filho. Ela havia saído para umas compras e da
rua me liga:
- Pai,
vem rápido, AGORA !, toma o
metrô linha 10, desce na estação Émile Zola e pega a saída
da Rue du Commerce e vem rápido. Te espero lá. ...Calma, não é acidente... É uma
bela surpresa pra você.
- Mas
eu estou bebendo um belo de um vinho
com o seu irmão...
- Vai
se arrepender ... E acrescentou: Mas tem que vir correndo pois ela
pode sair...
Cortei
a ligação; me troquei ligeiro e
disparei para a próxima estação,
ali pertinho. O meu filho que me perdoe; o vinho e o queijo deliciosos que
esperem... e desci pela escada como se foge de incêndio, de dois em dois
degraus, coração acelerado, na dúvida se era infarto ou se pela ansiedade de “bela” surpresa. Ela quem...?
Conheço
bem a filha que tenho; se era para correr é porque o motivo era válido.
Cheguei
esbaforido e devia estar vermelho que nem lagosta cozida... me aproximei,
arrumando o colarinho da camisa e quase não acreditei:
“Ela” era ninguém mais, nem menos, que a
Joan Baez! “Ela”, diante de minha filha. Caracas! exclamei de modo adolescente. E, tal qual a vez em que a conhecera, parei
abestalhado, esperando o coração voltar ao normal (e imaginando se o seguro saúde ainda
estava na validade...)
Ela
me reconheceu. Embora tantos anos passados, rugas surgidas –em ambos- cabelos embranquecidos
- em ambos, creio, sim, que ela me reconheceu. Sorria, modo
zombeteiro, e a mão nos olhos – de soslaio - com ar de “o
que você está fazendo aqui...?”
- Eu
vim te ver... –Pensei.
Permanecemos
num longo e solene silêncio, só interrompido quando a minha filha bateu uma
foto nossa, - eu, feliz que nem criança; ela, prometendo vir a Paris no próximo mês para um show no Grand Rex. "Por que não agora...?" Silêncio. Quebrando o impasse, sorri para a foto, ao lado do cartaz.
-
Acorda, pai... Vambora.
- Disse a Bia.
Joan Baez e eu numa galeria do metrô de Paris.
AMEI, Juju de la Pensión!!!! Corri com você pelas escadas!!! E paralisei com você, diante da deusa!!! E revivi com saudades os dias em Paris....
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