NO CINEMA COM LAURO FARIA
“SE VOCÊ MORRER, EU
TE MATO”
Esta frase que
ilustra a coluna, contundente, absurda e contraditória, serviu de epígrafe para
a mostra cinematográfica, de 16 de abril a 5 de maio deste ano, sobre SAMUEL FULLER (1912 – 1997), no cinema I do
Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio
de Janeiro. Esta retrospectiva veio em boa hora, já que o artista, visto como o
mestre do filme B (de baixo orçamento) e toda a sua obra – independente, polêmica
e iconoclasta – bate de frente com as produções milionárias de hoje em dia.
Ficamos contentes com a grande afluência de público, já que o diretor,
considerado primitivo, nunca foi uma unanimidade; também escrevia e produzia;
mas suas fitas sempre foram instigantes.
Fuller, também
conhecido como “O Poeta dos Tablóides”, começou a vida dentro de um jornal como
garoto de recados, arquivista, assistente do editor-redator-chefe e, depois,
repórter. Sempre quis ser editor de jornal; mesmo o menor do mundo, numa
pequena cidade, mas virou cineasta. Quando a América entrou na Segunda Guerra
Mundial, alistou-se como soldado raso, simplesmente porque “iria fazer as
maiores reportagens da sua vida”.
Munido com uma
câmera de 16 mm, filmou cenas de batalha e muito do cotidiano das trincheiras,
além de coisas horrendas nos campos de concentração. Estas lembranças de combatente estão
registradas na sua obra de referência AGONIA E GLÓRIA (“The Big Red One” - 1980),
presente no evento.
A sentença
controversa que dá título ao texto foi proferida na película CAPACETE DE AÇO
(1951). Um drama bélico no conflito da
Coréia (1950/53), que passou no antigo Cine Recreio de Cabo Frio, em 1957; o
assistimos, aos 14 anos; e o impacto jamais foi esquecido. A partir desta
época, começamos a prestar mais atenção às fichas técnicas das produções, além
do elenco; e os nomes dos diretores se tornaram mais importantes.
No filme, o
personagem principal é um veterano sargento (Zack – interpretado por Gene
Evans, um ator feio e atarracado, genial, enquanto eterno coadjuvante em
dezenas de fitas), calejado, grosso, desagradável, que faz uma improvável
amizade com um menino sul-coreano. Quando um prisioneiro de guerra – preservado
com vida para ser levado aos superiores – ironiza a oração que o menino,
baleado, tinha feito pedindo ao Buda que o sargento gostasse dele, Zack,
aporrinhado e enlouquecido, descarrega uma saraivada de balas nele e, em
seguida, desabafa: “Se você morrer, eu te mato”.
Nossa
admiração por Fuller se deve também ao fato dele ter vivido cerca de três meses
– na década de 50 – entre os índios Carajás.
Pretendia colher subsídios para escrever um roteiro sobre o livro
TIGRERO, que versava sobre um nativo que caçava as onças matadoras das reses
dos fazendeiros. Tal filme nunca saiu do papel por suas mãos; foi realizado, porém,
um documentário, com esse título, em 1994, por Mika Kaurismaki, em que a
presença de um envelhecido Fuller conta a outro realizador (Jim Jarmusch), as
peripécias daquele tempo e as diferenças – 40 anos depois – nas aldeias
devastadas dos índios. Em seu livro de memórias, ele confessou ter percebido
que os selvagens éramos nós... Tenho um amigo que freqüentou Hollywood, alguns
anos atrás ( Antônio Maltez ), conheceu Fuller e confirma: Ele era uma “
figuraça!”
Sam Fuller
dirigiu 31 produções, sendo 24 para a tela grande, com 51 scritps computados.
Entre os faroestes, causou estranheza, em 1949, EU MATEI JESSE JAMES. Enquanto outras versões mostram a execução
(pelas costas) do famigerado ladrão, no final, aqui, neste, o bandido morre com
menos de 20 minutos de filme; e acompanha a indiferença que segue o assassino
até sua própria morte.
Entre os filmes noir produzidos,
destacamos: ANJO DO MAL (1953), em que o excelente Richard Widmark faz um
batedor de carteiras às voltas com espiões comunistas; e: A LEI DOS MARGINAIS
(1961), onde um surpreendente Cliff Robertson interpreta um delinqüente
obcecado por vingar a morte do pai, assistida por ele, num beco escuro e
fétido. Esta cena, no jogo de sombras na parede, é uma das melhores coisas já
filmadas na história da sétima arte.
Foto:
Mini-Poster de: AGONIA E GLÓRIA.
Até
breve. THE END. ( Lauro Affonso faria / 29/08/2013
).
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